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Artigos 05/07/2022

Atualização: iniciativas legislativas frente aos impactos da pandemia no setor de Turismo brasileiro

*Andréa Seco

Após a promulgação de várias medidas provisórias pelo Governo visando regulamentar temas e trazer algum fôlego a setores extremamente atingidos em virtude da pandemia oriunda do surto da COVID-19 – a exemplo da MP 925/20 destinada a trazer medidas emergenciais para a aviação civil brasileira -, no dia 8 de abril de 2020 foi publicada a MP 948/20 que dispõe sobre o cancelamento de serviços, reservas e eventos dos setores de turismo e cultura em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

Sem dúvida alguma, o turismo trata-se de um dos setores econômicos mais atingidos pela crise sanitária atual, atingindo não apenas hotéis, agências de viagens, operadores de cruzeiros marítimos mas toda uma gama de atividades que fazem parte não apenas de destinos de férias, mas também festas populares e feiras de negócios, sendo as perdas estimadas globalmente na casa dos bilhões de dólares.

Neste cenário, a nova MP 948 mostra-se aplicável a todos prestadores de serviços turísticos e sociedades empresárias nos termos da Lei nº 11.771/2008 – tais como meios de hospedagem; agências de turismo; transportadoras turísticas; organizadoras de eventos; parques temáticos; acampamentos turísticos -, bem como cinemas, teatros e plataformas digitais de vendas de ingressos pela internet.

Para todos estes setores a norma prevê que na hipótese de cancelamento de serviços, de reservas e de eventos, incluídos shows e espetáculos, o prestador não será obrigado a reembolsar os valores pagos pelo consumidor, desde que assegure: a remarcação dos serviços, das reservas e dos eventos cancelados; ou a disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos, disponíveis nas respectivas empresas; ou outro acordo a ser formalizado com o consumidor.

Vale destacar que nas hipóteses de remarcação ou disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos deverá ser oportunizado ao consumidor o uso deste valor por um prazo de até doze meses contados da data de encerramento do estado de calamidade pública.

Todas estas operações que visam, prioritariamente, de forma louvável fomentar a continuidade da atividade de turismo em um momento pós pandemia, ao invés de cancelamentos imediatos e absolutos, deverão ocorrer sem custo adicional, taxa ou multa ao consumidor, desde que a solicitação seja efetuada no prazo de noventa dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória.

Neste ponto cabe uma importante reflexão ao prazo de noventa dias da solicitação para incidência das regras trazidas na norma, uma vez que é notório que milhares de cancelamentos e/ou renegociações já foram performadas entre prestadores de serviços e seus consumidores muito antes da publicação da MP, haja vista a situação pública de hotéis vazios e navios de cruzeiros cancelados e colocados em quarentena já há muitas semanas, exemplificativamente.

Não é difícil afirmar, sem margem para grandes dúvidas, que muitos destes negócios – sejam cancelamentos e/ou remarcações  – pretéritos ao texto legislativo se deram em formatos com condições eventualmente menos vantajosas aos consumidores do que os agora regulamentados, em que pese terem a mesma origem e fundamento para sua ocorrência, qual seja, a pandemia e calamidade sanitária em virtude do surto do novo coronavírus.

Pela MP estar inserida em um contexto no qual as relações jurídicas estão umbilicalmente vinculadas a regras e princípios protetivos do Código de Defesa do Consumidor, tal situação poderia potencialmente estimular uma onda de ações no Poder Judiciário questionando exatamente a criação de garantias de um tratamento diferenciado a determinado grupo de consumidores, em que pese todos estarem inseridos em uma mesma situação e motivados por um mesmo fundamento óbvio e público, na medida em que a situação de calamidade pública já ter sido reconhecida muito antes, ou seja, pelo menos desde o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

Por fim, vale uma menção especial ao fato de que a MP expressamente declara em seu texto legislativo que as relações de consumo ora reguladas caracterizam hipóteses de caso fortuito ou força maior e não ensejam danos morais, aplicação de multa ou outras penalidades, nos termos do disposto no art. 56 do CDC. Tal previsão certamente trará uma importante linha de defesa aos prestadores de serviço em futuras batalhas judiciais com seus consumidores já que tal reconhecimento poderá se traduzir em verdadeiro norte para se evitar condenações abusivas ou contrárias ao verdadeiro espírito que deve neste momento de exceção ser coroado, qual seja, a viabilização da sobrevivência de um dos setores mais importantes no fomento da economia do país, o turismo.

Como sabido a Medida Provisória gera efeitos imediatos e trará um direcionamento mais claro e nivelado nas relações entre prestadores de serviços e consumidores, mas dependerá de aprovação posterior no prazo legal do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei e estima-se que até lá entidades ligadas a representatividade de vários setores do turismo poderão contribuir para o aperfeiçoamento do texto legislativo.

Atualizações legislativas

Ao longo da tramitação da MP foram oferecidas mais de 140 propostas de emenda, sendo que o texto final foi convertido na Lei 14.046/20 publicada no dia 25/08/20 com efeitos imediatos.

Passados quase um ano desta publicação e com a manutenção do cenário pandêmico, no dia 15 de julho de 2021 foi publicada a Lei 14.186 visando alterar a Lei 14.046/20.

Por fim, no último dia 04 de julho de 2022, foi sancionada a Lei 14390/22 | Lei nº 14.390, que revoga dispositivos da Lei nº 14.186 e dá outras providências.

Em linhas gerais, este novo texto legislativo decreta que na hipótese de adiamento ou de cancelamento de serviços, de reservas e de eventos, incluídos shows e espetáculos, de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2022, em decorrência da pandemia da covid-19, o prestador de serviços ou a sociedade empresária não serão obrigados a reembolsar os valores pagos pelo consumidor. Porém, devem assegurar que o crédito seja utilizado pelo consumidor até 31 de dezembro de 2023.

As restituições de valores pelo prestador de serviço ou a sociedade empresária deverão restituir o valor recebido ao consumidor somente na hipótese de ficarem impossibilitados de oferecer a remarcação dos serviços ou a disponibilização de crédito nos seguintes prazos:

I – até 31 de dezembro de 2022, para os cancelamentos realizados até 31 de dezembro de 2021; e Ver tópico

II – até 31 de dezembro de 2023, para os cancelamentos realizados de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2022.

Para conferir a publicação completa clique aqui.

*Andréa Seco é sócia da área de Contencioso, Arbitragem e Mediação do escritório Almeida Advogados

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